Dom João Santos Cardoso
Arcebispo de Natal
Conforme o Documento Final do Sínodo, o “sensus fidei” ocupa um lugar central na Igreja Sinodal, pois fundamenta a escuta comunitária e o discernimento, elementos indispensáveis para a vivência da sinodalidade (n. 22-23). Teologicamente, o “sensus fidei” tem sua origem no Batismo e, como dom do Espírito Santo, capacita os fiéis a reconhecerem intuitivamente a verdade do Evangelho. Trata-se de um “instinto de fé” que não depende de erudição, mas da graça batismal, que torna cada cristão sensível às verdades do Evangelho. Diferentemente da opinião pública, o “sensus fidei” não se baseia em consensos sociais ou culturais, mas na concordância espiritual do Povo de Deus em comunhão com seus pastores.
Como destaca a Comissão Teológica Internacional no documento O Sensus Fidei na Vida da Igreja, ele não é uma opinião subjetiva, mas uma sensibilidade espiritual às realidades divinas, resultante da ação do Espírito na Igreja. O “sensus fidei” manifesta-se quando a comunidade de fé, em sua totalidade, vive e expressa, de forma espontânea e consensual, aquilo que é genuinamente conforme à fé apostólica. Está, portanto, intrinsecamente ligado ao “consensus fidelium”, que reflete a concordância do Povo de Deus em matéria de fé e moral.
O “sensus fidei” não substitui o discernimento pastoral, mas o complementa, sendo indispensável no processo sinodal. Os pastores, como guias do Povo de Deus, têm a responsabilidade de escutar atentamente as inspirações do Espírito Santo manifestadas por meio do “sensus fidei” nos diversos níveis da vida eclesial. O Documento Final do Sínodo ressalta a importância dessa interação, destacando que o “sensus fidei”, quando adequadamente discernido pelos pastores, contribui para a formação do “consensus fidelium” (n. 22). Este último constitui um critério seguro para confirmar a autenticidade da doutrina apostólica, pois reflete a ação do Espírito Santo em toda a Igreja. Assim, embora o “sensus fidei” seja vivenciado individualmente, ele se integra ao consenso coletivo, que orienta e fortalece a missão evangelizadora da Igreja.
O “sensus fidei” é o princípio da sinodalidade e essencial para a renovação missionária da Igreja. Conforme o Documento Final do Sínodo (n. 81), a Igreja Sinodal deve ser continuamente recomposta e reorientada em sua missão, enraizada no “sensus fidei”. Isso exige uma conversão comunitária que leve a Igreja a caminhar junto ao Povo de Deus, ouvindo suas alegrias, esperanças, tristezas e angústias.
A sinodalidade se caracteriza pela comunhão, participação e corresponsabilidade do Povo de Deus na missão da Igreja. Nesse contexto, o “sensus fidei” é um princípio fundamental que sustenta o discernimento comunitário e a tomada de decisões em espírito de unidade. Por meio da escuta mútua e do diálogo, a Igreja Sinodal torna-se mais fiel à sua vocação de testemunhar o Evangelho em um mundo plural e desafiador. Assim, o discernimento eclesial é profundamente enriquecido pelo “sensus fidei”, que permite à comunidade cristã captar as inspirações do Espírito Santo e responder de maneira fiel e criativa às exigências da missão (Doc. Final do Sínodo, n. 83). Dessa forma, a prática da escuta atenta e do diálogo sincero torna-se essencial para que a Igreja vivencie plenamente sua sinodalidade.
O “sensus fidei” fortalece a sinodalidade, promovendo uma Igreja mais participativa, inclusiva e missionária. Ele ressalta que a verdade da fé não pertence exclusivamente aos líderes eclesiásticos, mas é um dom do Espírito Santo compartilhado por todo o Povo de Deus. Dessa forma, todos os batizados, unidos pelo Espírito, desempenham um papel ativo na comunhão e na missão da Igreja, que, ao integrar a escuta do Povo de Deus com o discernimento pastoral, manifesta sua identidade sinodal e caminha unida rumo ao Reino Definitivo.